A Oração Centrante é um nome contemporâneo para a prática daquilo que Jesus, no Sermão da Montanha, descreve como "rezar em segredo". Quando fores orar, ensina Ele, "entra no teu quarto (interior), fecha a porta e ora a teu Pai em segredo; e teu Pai que vê em segredo, lhe recompensará." (Mt 6,6). No decorrer do tempo, essa oração ganhou outros nomes como "oração pura", "oração da fé", "oração da simplicidade", "oração do coração", etc.
O ensinamento de Jesus tem suas raízes no Antigo Testamento. Por exemplo, a experiência de Deus no Monte Horeb, como "pura experiência"; a coluna de nuvem pela qual Javé conduziu seu povo por quarenta anos através do deserto; a nuvem no templo construído por Salomão no tempo de sua consagração; e a exortação do Salmo 46:10, que diz, "Aquietai-vos e conhecei que eu sou Deus".
No Novo Testamento ouvimos que Maria foi coberta por uma sombra, no momento da Encarnação; a nuvem que cobriu os discípulos no Monte da Transfiguração; o silêncio atento de Maria de Betânia aos pés de Jesus na casa de Maria, Marta e Lázaro; e a escuridão que cobriu a terra no momento da Crucificação de Jesus.
A Tradição Cristã, especialmente dos Padres e Madres do Deserto no quarto século, interpretou este conselho sábio de Jesus como referindo-se ao movimento para além da consciência psicológica ordinária, ao silêncio interior no nível espiritual de nosso ser e para além dele, ao mistério da união que acontece na Habitação Divina, dentro de nós.
Esta tradição continuou com os hesicastas da tradição ortodoxa oriental, em particular pelo monge sírio do século sexto, conhecido como Pseudo-Dionísio; Mestre Eckhart, Ruuysbroek e os místicos da região do Reno (Alemanha); o autor anônimo de "A Nuvem do Não-Saber", do quarto século; a tradição Carmelita com Teresa de Ávila, João da Cruz, Teresa de Lisieux e mais recentemente, o monge trapista Thomas Merton.
Esta tradição se tornou conhecida como contemplação Apofática. Esta não é uma oposição à chamada contemplação Catafática, que recorre ao exercício de nossas faculdades racionais para atingir a união divina. De fato, a contemplação catafática é normalmente necessária como preparação para a experiência apofática que passa além do exercício das faculdades humanas para descansar em Deus. O Sábatico do Antigo Testamento é uma figura desse descanso. Jesus convidou seus discípulos ao mesmo descanso quando disse: "Aprendei de mim pois sou manso e humilde de coração e vocês encontrarão descanso para suas almas." Descansar em Deus é o termo usado por Gregório o Grande, no século sexto, para descrever a oração contemplativa como compreendida no seu tempo.
A tradição cristã tem excelentes orientações e guias para os iniciantes na jornada espiritual, preservadas especialmente na prática antiga da Lectio Divina, que se tornou a prática central dos monges e monjas Beneditinos através dos tempos. A leitura orante dos textos do Antigo e Novo Testamentos levam à reflexão sobre os mistérios de Cristo; respondendo com atos de fé, esperança e amor; e finalmente, ao descanso em Deus, como fruto da meditação discursiva e sua simplificação gradual. As três Virtudes Teologais acima mencionadas tornaram-se as principais inspirações transformadoras do Espírito Santo, conduzindo à união divina.
A Oração Centrante coloca em prática as duas primeiras recomendações da fórmula de Jesus em Mateus 6,6, deixando para trás todas as preocupações externas e por descontinuar, pelo menos na intenção, o diálogo interior que usualmente acompanha a consciência psicológica. A última consiste de comentários e emoções racionais a eventos, pessoas e percepções sensoriais entrando ou deixando nossa vida cotidiana.
A Terceira recomendação de Jesus - orar em segredo - parece ser a prática que mais tarde se tornou conhecida na tradição cristã como oração contemplativa. Embora ainda haja muitas interpretações legítimas da palavra "contemplação", o estágio da oração que S. João da Cruz descreve como "contemplação infusa", tornou-se geralmente aceito na teologia espiritual subsequente, como o sentido definitivo.
Há na verdade, nos escritos dos místicos cristãos, excelentes descrições do pleno desenvolvimento da jornada espiritual. Porém esse processo, desde o seu início até o final, quando em geral desemboca na união transformativa, não é tão claro assim. Há muitas formas de espiritualidade cristã, algumas das quais organizadas em estágios. Mas até essa abundância de variedades e recomendações torna difícil para o 'buscador' comum, encontrar um mapa ou guia com que possa se orientar e 'negociar'. Esses estágios vieram a ser chamados respectivamente, o caminho purgativo, iluminativo e unitivo. O purgativo e o unitivo são bem diferenciados, mas a abordagem de um e de outro não parece considerar adequadamente os obstáculos físicos, psicológicos e espirituais que dificultam o processo, especialmente as motivações inconscientes e os hábitos do comportamento negativo.
A Oração Centrante foi concebida como um caminho para se mover do início até o final da união transformadora. Sugere um método prático de entrar naquilo que Jesus designou de "aposento interior" e por deliberadamente desapegar-se de preocupações externas, simbolizadas pelo sentar confortavelmente, fechar os olhos e consentir na presença e ação de Deus dentro de nós. À medida que essa disposição de receptividade consciente se estabiliza através da prática por duas vezes, diariamente, somos gradualmente preparados para a graça do Espírito Santo, de orarmos, ou mais exatamente, de nos relacionarmos com o Pai em segredo. Isto foi interpretado pelos Padres e Madres do deserto, (também a tradição Apofática), como significando o desapego de nossos projetos pessoais, expectativas por consolações divinas, nossas descobertas psicológicas e auto-reflexões de qualquer tipo. Na Oração Centrante, o símbolo sagrado, tal como a palavra de oração, ou 'palavra sagrada', ou apenas um 'olhar' interior dirigido a Deus, ou notar a própria respiração, ajuda a manter a intenção e o consentimento de nossa vontade direcionados à presença de Deus e sua ação dentro de nós.
A Oração Centrante é o primeiro de dois estágios que levam à orar em segredo". O último pressupõe o relacionamento com Deus além de pensamentos, sentimentos e atos particulares. A única iniciativa que nos cabe durante o período de Oração Centrante é manter nossa intenção original de consentir na presença e ação de Deus em nós. A Oração Centrante conduz diretamente à experiência "apofática" ou "contemplação infusa", que é puro dom de Deus.
Há outras maneiras de nos encaminharmos ou nos dispormos para a oração apofática ou oração em segredo. A Oração Centrante atende a uma necessidade crescente por tempo e espaços de silêncio em nossas vidas, devido ao barulho incessante, à invasão da media por todo lado, e o passo acelerado com que caminhamos hoje.
A base teológica da Oração Centrante é abordada no capítulo três do livro "Invitation do Love", ('Convite a Amar', ainda sem tradução em Português). O processo da Lectio Divina é descrito no capítulo cinco e a base teológica da Oração Centrante é melhor discutida no capítulo final do capítulo entitulado: "Toward Intimacy with God" (Em direção à Intimidade com Deus").
Traduzido por Jandira Soares Pimentel, de texto do site Contemplative Outreach (Thomas Keating, OCSO, entitulado Centering Prayer).